domingo, 14 de outubro de 2012

Enigma

     A lembrança vem intempestivamente quando a prolixidade da vida trás uma série de fatos à mente. Coisas banais levam à uma dialética da mente com a alma, refutando as hipóteses de experimentação de Kelinger, ou qualquer outro cientista que trate tudo como matéria, ciência e fórmula. É como se Pasteur tivesse criado uma abiogênese de sentimentos. E bem, realmente foi uma geração espontânea de um sentimento intensa e extremamente alienígena.
     Sempre tão exata, lógica e prática quis estudar um algoritmo que diagnosticasse tudo o que era tão subliminar dentro de minhas conexões sinápticas. Talvez tivesse queimado mais rapidamente todos os meus neurônios com essas explicações do que com o uso de cannabis ou ópio.
     E em meio a tantos dilemas biológicos, físicos e matemáticos, não houve uma integral, derivada, teoria da evolução ou fórmula de energia quântica ou cinética que me desse uma coordenada para um resultado final. Nem eixo x, nem z, nem y. Nem Bhaskara, Pitágoras, Darwin, Mendel, Newton, Galileu, ou Benjamin Franklin. Tudo e todos que até então me explicavam a vida, foram falhos nesse momento. E agora? Qual fonte de pesquisa usar? Como achar uma explicação sensata e que gerasse em mim a saciedade dessa busca que inquietava meu ego?
     Plano B. Humanas. Nietzche aconselhava em grande parte de meus questionamentos bizarros. Quantas vezes Zaratustra falava coisas que prendiam e me explicavam tanto. Quantas vezes vi coisas que eram feitas além do bem e do mal. Quantas vezes o niilismo foi tão prático como justificativa. Platão também sempre esteve em cabeceira, teorizando a questão do desprendimento e da falta de egoísmo. E Lacan por fim me afirmava coisas surrealistas que justificavam fenômenos como amor, ódio e agressividade. Mas nada se encaixava na totalidade do que eu buscava...
     E a mente atormentada, lógica, teórica e sempre pouco prática.
     Ah! Alvarez de Azevedo. Talvez esse sim, em seu pessimismo me dissesse o que eu precisava ouvir. Ou Flaubert me mostrasse que não se passava de um bovarismo imbecil.
     Só sei que naquela noite, maldita noite, o estado etílico me atingiu como uma ação que gerou uma reação que então trouxe uma mudança em minha vida. O ceticismo sentimental foi quebrado pelo sorriso mais lindo que eu poderia receber de alguém. E depois o paradigma de que todo mundo do meu clico social era fútil e não plausível de acrescentar nenhuma forma de conhecimento para mim, foi descartado em alguns meses de conversa fiada, engraçada e instigadora de desejos incontroláveis de repetir aquela noite.
     Enfim, foi inevitável que aquele contato acontecesse novamente. Em meio a desencontros o encontro inesperado (ou não), confirmou a tese que me intrigava de que aquele sorriso certamente era capaz de me tremer as pernas e disparar uma sinergia que envolvia minha alma em um mundo paralelo e descartava todos os princípios que sempre carreguei como base de respostas.
     E foram tantos por quês. Tanta pesquisa em google, ask, sessões de terapia e psiquiátricas. O fato é que aquela aura iluminada me trouxe uma nova visão de mundo, de sorriso, de patifaria intelectual, de ampliação de amizades, do diabo a quatro com o rabo entre as pernas. Surrealismo e muita dificuldade de aceitação. E os pensamentos lógicos e teóricos vieram numa segmentação de coisas ainda mais inexplicáveis, palavras soltas que causavam aquela espontaneidade estranha ao se olhar para o teto, ou fechar os olhos e contentar-se com palavras dispersas que tinham no fundo todo um significado:
     - dálmata, sorvete de flocos, algodão doce alvo, chocolate branco com gotas de chocolate preto, pinguins no meio da neve, ameixas na cobertura de chantilly, bola de futebol, beijinho de coco com cravo, doce de leite ninho, papel branco com bolinhas pretas... ah, tantas coisas mais, que poderia perder muito tempo com comparações, senão todo o tempo do mundo.
     E na convivência, surpresas cada vez mais encantadoras, vontade de sempre cativar, medo de perder, sorrisos lindos e inspiradores e uma companhia insubstituível. E sempre mais palavras remetendo à materialização de alguém que fez e faz diferença:
      - bisnaguinha, requeijão com cheddar, doritos, campari, whisky, suco de goiaba, pimentinha, confete, incenso, filosofia, psicologia e muito mais que ainda pretendo conhecer.
      E os por quês? Talvez seja melhor não procura-los mais. Creio que eles nem sendo porquês escritos juntos, me explicarão coisa alguma.
      Eis que um sorriso veio e me tirou todas as teorias de relatividade, ação-reação, evolucionismo, desprendimento, egoísmo, posse , seleção natural, pessimismo, narcisismo, imaginação excessiva e sei lá mais o que.
      Sem rótulos. Só por ser assim, tão especial.
      E volta então aquela antiga vontade de escrever.